UM TEXTO DO MEU AMIGO E CAMARADA, CORONEL DE CAVALARIA MATOS GOMES, CRUZ DE GUERRA, COM O QUAL EU CONCORDO NA INTEGRA E RECOMENDA A LEITURA.
"Os militares e a análise da guerra no espaço público
Esta guerra na Ucrânia é como todas a outras. É um facto político recorrente. Pode ser analisado recorrendo a métodos racionais ou emocionais. Para os militares esta guerra é analisada recorrendo à racionalidade. Qual é o objetivo da guerra: «Destruir o inimigo ou retirar-lhe a vontade de combater» (Clausewitz — A Guerra). Quando uma parte destrói o inimigo a guerra termina com uma rendição; quando uma parte entende que é mais ruinoso jogar no tudo ou nada, que perdeu o ânimo para combater a guerra termina por negociação.
Os militares reconhecem a ineficácia de insultar os contendores, exceto para os implicados no fragor do combate e da batalha, como escape das ansiedades. Os militares também sabem que a análise de uma guerra não depende da bondade e ou maldade dos propósitos dos contendores, mas do seu potencial, o que inclui equipamento, treino, comando e combatividade. Os militares sabem que resultado das guerras entre Atenas e Esparta, das invasões romanas, napoleónicas e nazis, a batalha de Trafalgar, ou de Lepanto, a ocupação das Américas e de África não foi determinado pela moral, nem pelos princípios da guerra justa, já de si um conceito bastante difuso, que hoje surge associado a um outro que é o do Direito Internacional, aplicado segundo as conveniências e os preconceitos, de forma amoral, porque hipócrita.
A análise que os militares portugueses têm em geral feito nos órgãos de comunicação vem sendo contestada pelos maximalistas e pelos belicistas por colocarem em causa o facto de eles utilizarem os instrumentos de estudo da guerra e não os slogans e as palavras de ordem estabelecidas pelos que estão por detrás deste conflito, disfarçados de defensores de princípios morais e éticos!
Os militares da craveira intelectual da maioria dos que mais têm aparecido nos órgãos de comunicação social e com a sua experiência nos conflitos europeus — Kosovo, Bósnia, Sérvia, Iraque, Afeganistão — em organizações militares e políticas internacionais, sabem que a moral — O Bem e o Mal; e a ética, o que deve ser feito — nunca são elementos levados em consideração na decisão de desencadear uma guerra, nem no planeamento e na condução de operações. Sabem, isso sim, que os argumentos morais e éticos constrangem as pessoas, que são munições de ação psicológica para ganhar as opiniões públicas, fortalecer as forças amigas e desmoralizar as inimigas. Os militares sabem que os argumentos morais podem ser e são quase sempre utilizados retoricamente como propaganda para mascarar motivos menos nobres e os que detêm maior poder militar, económico e comunicacional utilizam-nos sem considerações de ordem moral.
A maioria dos militares que vêm analisando esta guerra no espaço público têm colocado os argumentos de ordem moral no campo das ações de propaganda e das ações de guerra psicológica, utilizadas por ambos os beligerantes. Este desmascaramento dos «Bons» choca com a narrativa pré-estabelecida pelos manipuladores oficiais, incluindo jornalistas. Daí a acusar os militares de “putinistas”, isto é, de vendidos ao inimigo, aos «Maus», foi um passo. A falsa moral é como a falsa virtude: tenta acusar os outros antes de ser desmascarada.
Os militares convidados pelas TVs e rádios são dos que leram Tucídides e a sua Guerra do Peloponeso (uma excelente tradução do coronel David Martelo). Conhecem o episódio em que os atenienses navegaram até à ilha de Melos para sufocarem uma revolta (416 ac) e quando os Mélios lhes disseram que estavam a lutar pela liberdade (um argumento moral), o general de Atenas respondeu que podiam combater e morrer ou render-se, adiantando que: « os fortes fazem o que têm poder para fazer e os fracos aceitam o que têm de aceitar.» (um argumento realista).
A análise militar não parte da interrogação se sou dos bons ou dos maus. O bom e o mau depende do lado em que se encontram os contendores, dos seus interesses e objetivos. Os militares partem das perguntas: Sou suficientemente forte para lutar (de que meios disponho)? Que hipóteses tenho de vencer (que meios dispõe o meu inimigo, qual a relação de forças? Que perdas me são aceitáveis?
O que os militares têm feito é equacionar o mais realisticamente possível com as informações disponíveis as opções dos contendores. Do outro lado, do lado dos seus detratores, encontram-se os pontas de lança de bancada, cada um com as suas razões para defender a sua dama, mas de facto sem nada ajudarem as verdadeiras vítimas da agressão, cujo sofrimento é utilizado em nome da moral, mas sem moral, e sem nada contribuir para deter os agressores, antes pelo contrário, criando condições para estes justificarem a escalada de violência ".
Carlos Matos Gomes
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- Antonio Da Silva CoelhoUma boa e lúcida análise da situação , tal como é apanágio do Matos Gomes , explícita qb , pode ser que muitos daqueles que berram e dizem apenas aquilo que lhes mandam , cf muitos jornalistas e "comentadores" das diferentes TV , aprendam alguma coisa , pelo menos a fazer um estudo que conduza a uma análise mais próxima da realidade , daquilo que estamos a viver nesta guerra . Obg MG adoro ler os teus comentários pq eles são muito elucidativos e fundamentados .
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- Vitor AlexandreConcordo com o artigo.Este artigo pode claramente ser aplicado a qualquer conflito como forma de análise.Certamente o seu autor vai ser acusado de putinista.Nesta guerra dos media passou a existir apenas os Putinistas os Zelenskistas .os realistas e de bom senso desapareceram.Tristemente constato que ficou perigoso ser realista e com bom senso . triste muito triste.
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- Carlos AtaidePartilhado
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- Manuel-António Silvatarda o necessário acordo de paz, temo que o povo ucraniano seja o cordeiro pascal, sacrificado em nome de insondáveis interesses...
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- Fernando Manuel CostaResumindo, e com o devido respeito por tão respeitáveis militares: CONDENAM OU NÃO A INVASÃO DA UCRÂNIA PELA RÚSSIA?Será que para responder a esta questão é preciso ser especialista em geo-estratégica militar?Será que aos comuns dos cidadãos, que nada percebem de assuntos militares e de guerras, está vedado o direito a terem opinião, sem serem acusados, como ja li, de pertencerem a um "rebanho"?
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Ocultar 11 respostasA opção selecionada é Mais relevantes e algumas respostas podem ter sido filtradas.- Antonio RegedorFernando Manuel Costa resumindo: se leu não percebeu nada e faz uma pergunta ignorante. Se percebeu é muito pior. Leia, tantas as vezes que precisar para perceber.6
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- Manuel Pinto JorgeFernando Manuel Costa A que horas dá jeito irem lá a casa explicar ? É melhor ?
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- Fernando Manuel CostaLi e repito que não gostei.Fui oficial de operações especiais na Guiné, tendo até conhecido Otelo Saraiva de Carvalho.Mas agora como simples cidadão não me inibo de manifestar desagrado perante alguma presunção por parte de quem, por muito conhecer de matéria geo-político-militar, exponha suas bem elaboradas teses, com considerações pouco abonatórias para com os que, bem ou mal, formem opinião apaixonada sobre o que envolve à INVASÃO DA UCRÂNIA PELA RÚSSIA.
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- Jose Luis RodriguesFernando Manuel Costa OS MILITARES QUE COMENTAM A GUERRA NÃO TEM DE TOMAR PARTIDO, SÃO CONVIDADOS PARA COMENTAR
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- Antonio RegedorFernando Manuel Costa Tem direito a opinião. Será desejável que seja racional e bem informada. Como deve compreender, a opinião "apaixonada" como refere e pretende defender é contrária à razão. Donde, deve ser evitada para obviar ao afastamento da realidade a que conduz. Mas isso fica com a sensatez de cada um. Apenas o interpelei porque a pergunta que faz não é legítima. Ninguém tem o direito de obrigar outro a dizer que parte toma num conflito. Quem faz juízo não toma partido. Apenas analisa racionalmente e perante os factos. Na Grécia Clássica havia a figura de "suspensão do juízo". Coisa que fazemos muito na Filosofia para a compreensão do autor. A análise técnica militar permite compreender o fenómeno sem o irracionalismo animalesco da paixão tão bem expresso na "Tragédia Grega" .4
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- Vitor AlexandreFernando Manuel Costa responde,se fosses jornalista qual a tua posição? A de informar ou de opinar?Neste caso qual a posição de um militar que faz análise dos acontecimentos? Analisar pelos conhecimentos militares que tem ou opinar a favor ou contra uma das partes?.E ,porque tem um analista de ser contra ou a favor desta ou daquela parte? Ou ainda deste ou daquele conflito.A tua pergunta é descabida,até porque acredito todos serem contra as guerras.Deixaste claro que eu nunca veria nenhuma análise tua,seria seguramente parcial,serias considerado um Zelenkista.2
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- Vitor AlexandreAntonio Mata vi o video todo sim.e seria muito bom todos lerem o que um professor americano pensa deste conflito e as comparações que faz relativamente a conflitos com americanos,seus compatriotas.
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- Antonio MataVitor Alexandre, é difícil romper a barreira da contra informação... mas não desisto.
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- Vitor AlexandreAntonio Mata somos dois meu caro.Reparei que é ou reside na zona de Sintra.minha terra.
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- Jose MonteiroAntonio Mata É dificil que algo ajude a quem nãp quer ver ambos os lados da moeda! Não vou buscar a queda do muro de Berlin e o que a seguir foi acordado e quase nunca respeitado! Fico pelo documento que tenho mais à mão: o de um militar dos EE UU:“FRANCAMENTE, HÁ MENOS DANOS NA UCRÂNIA DO QUE INFLIGIMOS AO IRAQUE QUANDO ENTRAMOS LÁ” | Cortes 247YOUTUBE.COM“FRANCAMENTE, HÁ MENOS DANOS NA UCRÂNIA DO QUE INFLIGIMOS AO IRAQUE QUANDO ENTRAMOS LÁ” | Cortes 247
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A opção selecionada é Mais relevantes e algumas respostas podem ter sido filtradas.Online - Armando RamalhoSerá possível admitir que os ucranianos não tenham instrução suficiente para saber esta simples prosa elementar, mas correta? Seguramente há muito mais, mas isso seria somente especulação. No final veremos.
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